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terça-feira, 20 de outubro de 2015

O incômodo de um país de commodities


Assim como o avião, cuja invenção costumamos atribuir a Santos Dumont, de forma simplista, porque na verdade o invento foi resultado de uma série de contribuições, inclusive dos irmãos Wright, até chegar a um modelo ideal de desenvolvimento, a máquina de escrever também pode ser considerada uma criação coletiva da humanidade, com esboços desde o surgimento da prensa de Gutenberg, mas com o reconhecimento da sua funcionalidade apenas em 1867, com a patente do americano Christopher Latham Sholes.

Cabe aos brasileiros defenderem a participação do Padre Francisco João Azevedo como um dos pais desse invento, já que o religioso só não conseguiu o crédito merecido porque jamais teve a oportunidade de apresentar sua criação ao mundo, impedido de embarcar para a Exposição de Londres, em 1862, por dificuldades de acomodação, depois de ter conquistado uma medalha de ouro, em 1861, na Exposição do Rio de Janeiro, com a presença do Imperador Pedro II.

Segundo a lenda, Padre Azevedo foi enganado e teve seus desenhos roubados por um estrangeiro, fato que o desestimulou a continuar com o seu projeto, concretizado como uma máquina de taquigrafia.

A suspeita é de que suas ideias tenham servido para que Sholes aperfeiçoasse seus protótipos, principalmente no desafio que enfrentava para o transporte de papel, coincidentemente resolvido com um sistema de pedal, próximo da solução criada por Azevedo, de acordo com as descrições da máquina.

Hoje, essa discussão tem importância menor, porque o reconhecimento, a essa altura, serve apenas como informação histórica, sem qualquer resultado prático. Mas importa muito a forma como Azevedo e o seu invento foram tratados pelas autoridades da época, que preferiram levar para Londres as amostras locais dos produtos agropecuários, ao invés de apresentar nosso potencial criativo.

Da mesma forma, Dumont também não recebeu qualquer incentivo público, conquistou Paris com seus balões e aviões revolucionários tendo, como única fonte de financiamento, as colheitas de café que saíam da fazenda do seu pai.

Passaram-se pouco mais de 150 anos desde que a máquina de Azevedo foi deixada para trás. De lá para cá, permanecemos exportadores de commodities e importadores de tecnologia, fadados ao colonialismo, sem qualquer possibilidade de mudança.

Luciano Toriello - 20/10/2015
Escrito com uma Remington Letter-Riter de 1950



domingo, 18 de outubro de 2015

Como cuidar bem de uma máquina de escrever - 10



Nunca deixe sua máquina cair!

As máquinas foram feitas para durar até a eternidade, mas não suportam quedas nem qualquer outro tipo de impacto.

Suas peças mecânicas foram construídas e montadas com precisão e, com a batida, ficam tortas e desalinhadas, comprometendo o funcionamento, com poucas chances de conserto, já que não há mais peças de reposição.

O que pode ser feito, dependendo do caso, é a confecção de alguma peça por um torneiro mecânico, com a mão de obra de um bom mecanógrafo, mas esse tipo de trabalho não sai barato, por isso só vale a pena para máquinas raras de colecionadores ou que estejam ligadas à memória afetiva, tendo pertencido a alguma pessoa querida da família.

Se não for o caso, melhor esquecer. Compre outra máquina e cuide melhor, para que não caia outra vez.

Luciano Toriello - 18/10/2015
Escrito com uma Olympia Progress de 1931


terça-feira, 13 de outubro de 2015

Como cuidar bem de uma máquina de escrever - 9










9. As máquinas de escrever têm uma tendência de escorregar lateralmente, com o movimento do retorno do carro, atrapalhando a datilografia.

Isso acontece mais com as máquinas portáteis, mais leves, que têm os pés de borracha já ressecados e sem aderência.

Em uma das cenas do filme 'A Datilógrafa' (Populaire, 2012), uma das candidatas ao prêmio de datilógrafa mais rápida chega a usar um grampo sargento para segurar sua máquina. Um exagero, claro, para dar um tom de humor.

Para estabilizar a máquina, basta usar um pedaço de borracha antiderrapante sobre a mesa, colocado como um tapete. Custa pouco e pode ser encontrado com facilidade nas casas especializadas em borracha.

Você pode cortar um pedaço que seja um pouco maior que a área da base da sua máquina, para ser usado e guardado junto com ela, ou cobrir a mesa toda com a borracha, protegendo também o tampo de riscos, tão comuns ao ambiente de trabalho.



Luciano Toriello - 12/10/2015
Escrito com uma Olivetti Studio 42

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Como cuidar bem de uma máquina de escrever - 8

8. Mantenha os tipos limpos

Com o uso, os tipos acumulam tinta e fibras da fita, uma sujeira que fica tão espessa que acaba cobrindo os vãos formados no miolo das letras. Com isso, a máquina começa a borrar na escrita, dificultando o entendimento, já que o "e" pode ser facilmente confundido com um "o".

Antes, as máquinas costumavam vir acompanhadas de uma escova com cerdas duras para fazer essa limpeza, tanto que alguns colecionadores gostam de ostentar esse apetrecho no estojo das suas preciosidades.
Com um palito ou uma agulha, você consegue remover a sujeira acumulada no miolo das letras
Uma bobagem, porque o serviço pode muito bem ser feito por uma escova de dentes com cerdas duras. Para facilitar, basta umedecer a escova com querosene.

Nos casos mais difíceis, é preciso recorrer a uma ferramenta com a ponta bem fina, como um palito de dentes ou uma agulha, para desencavar a sujeira, principalmente nas letras como "a", "e", "b", "o" e todas as demais com espaços internos fechados.

Se sua máquina estiver borrando, você vai ficar surpreso com o resultado.

Luciano Toriello - 06/10/2015
Escrito com uma Facit TP1


terça-feira, 6 de outubro de 2015

Como cuidar bem de uma máquina de escrever - 7


7. Nunca coloque óleo nas barras dos tipos ou outros mecanismos da máquina.

Se as barras dos tipos estão grudando, ou seja, não voltam depois de bater na fita, a solução não é colocar óleo, de qualquer tipo, nem mesmo aquele moderno, em spray, que você comprou enquanto esperava na fila do caixa do supermercado e não sabe o que fazer com aquilo.

Esse defeito só é resolvido com uma limpeza feita com ar comprimido, para tirar a poeira acumulada nos pequenos vãos que, com o tempo, sua máquina acumulou enquanto ficou exposta sem a proteção de uma capa.

Lembre-se, o óleo lubrifica, mas também atrai a poeira, formando uma massa gosmenta que impede os movimentos. Se colocar óleo em cima da poeira, sem uma limpeza anterior, imagine e tamanho do problema para quem vai limpar depois.

Um profissional desmonta todas as peças, limpa com ar comprimido, faz uma limpeza fina com querosene e promove um polimento nas partes cromadas, além de revitalizar os cilindros de borracha. Para isso, é preciso ter ferramentas e conhecimento, por isso meu conselho é que ninguém se arrisque a fazer isso se não tiver alguns conhecimentos mecânicos.

Melhor procurar um mecanógrafo a arriscar por conta própria. Mas se for impossível, experimente o ar comprimido. Sem a sujeira, a maioria dos problemas é resolvida.

Luciano Toriello - 06.10.2015
Escrito com uma Facit TP1

domingo, 4 de outubro de 2015

Como cuidar bem de uma máquina de escrever - 6

Cada dedo fica responsável por teclas específicas - Método de Datilografia Mennet - 1956

10. Tecle suavemente - não afunde os dedos com força exagerada.

As máquinas de escrever mecânicas foram projetadas para funcionar com o menor esforço e maior velocidade, mas não suportam brutalidade, podendo desalinhar os tipos ou empenar as barras sob uma pressão exagerada, mesmo as mais robustas.

Antes, era comum que os jovens fizessem um curso de datilografia para aprender a escrever usando todos os dedos. Hoje, com os smarthphones e Internet, essa exigência deixou de existir, basta ser rápido. Mas ainda não conheço quem consiga escrever com boa velocidade sem olhar para o teclado, como os bons datilógrafos fazem.

Da mesma forma, todos os datilógrafos transitam facilmente entre uma máquina de escrever e um teclado de computador, mas quem não tem a técnica, sofre diante da máquina, por isso, rejeita.

Com uma boa postura, o datilógrafo pode escrever por um bom tempo com menor esforço - Método de Datilografia Mennet - 1956

Se você não aprendeu a datilografar, mas se interessa por máquinas de escrever, encare o desafio como uma oportunidade de desenvolvimento pessoal, pegue um método de datilografia e acompanhe as lições, treinando todos os textos com os 10 dedos, sem se deixar desanimar.

Vamos lá! asdfg çlkjh asdfg çlkjh asdfg çlkjh asdfg çlkjh...



Luciano Toriello - 04.10.2015
Escrito com uma Groma Modell N (uma máquina da década de 1940 com ótimo funcionamento, tratada sempre de um jeito bem suave, como uma antiga dama merece)

sábado, 3 de outubro de 2015

Como cuidar bem de uma máquina de escrever - 5


Coleção de fitas de máquinas de escrever de Ronaldo Oliveira


5. Troque a fita - acredite, ainda há vários fabricantes que produzem fitas para máquinas de escrever, por um décimo do custo do cartucho mais barato de uma impressora. Certamente há um armarinho perto de você que ainda vende o produto, basta chegar no balcão e perguntar bem alto, para todo mundo ouvir: - Você tem fita para máquina de escrever? - estou certo que receberá um sorriso em troca, mesmo que não tenha o produto.
As fitas são encontradas em dois tipos, preto e vermelho e apenas preto, para quem dispensa a segunda cor e pensa na economia, porque pode ser virada para alcançar o dobro do rendimento.
O mais comum é o padrão Olivetti, em que a fita acompanha um carretel plástico padronizado para encaixar nesse tipo de sistema, diferente do Remington Rand, em que a fita vem enrolada em um suporte plástico pronto para ser encaixado nas máquinas da marca.

Da esquerda para a direita, padrão Remington Rand, Olivetti preto e Olivetti preto e vermelho

Mas o que muda é apenas o suporte. Ambas têm a medida 13mm X 9m, podendo ser rebobinadas nos cartuchos originais da máquina.
Sempre dou preferência pelos carretéis originais e opto por trocar a fita. Os antigos, mesmo de plástico, costumam ter o gancho de metal, que facilita a fixação da fita, enquanto os novos são visivelmente frágeis.
Não se preocupe com os dedos sujos de tinta porque a sujeira sai com água e sabão. Apenas tome cuidado para não sujar a máquina.

De tão bonitas, as antigas latas são objetos de desejo dos colecionadores. A Old Town Hermetic nunca foi aberta

Pouca gente sabe ou se recorda que antigamente as fitas vinham em latas decoradas como obras de arte. A maioria era importada, mas havia as nacionais, como Helios e Pelikan.
Essas embalagens são bastante raras e se tornaram objeto de desejo dos colecionadores, chegando a alcançar valores astronômicos, acima de 1 mil dólares.

A decoração das latas de fitas buscava agradar ao público feminino da época, na sua maioria formado pelas secretárias e datilógrafas


Hoje, pude ver a coleção de fitas de Ronaldo Oliveira, o maior especialista em máquinas que conheço, e aproveitei para tirar algumas fotos para o Texto Batido. Aproveitem, são bem raras.

Luciano Toriello - 03.10.2015
Escrito com uma Facit TP1

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Como cuidar bem de uma máquina de escrever - 4


4. Amorteça a batida - use duas folhas de papel
Os manuais das máquinas de escrever davam essa instrução para que os tipos não marcassem o rolo de borracha.
Hoje, essa recomendação é ainda mais necessária, mas por outro motivo. Como a borracha dos cilindros está cada vez mais dura pelo ressecamento, sem que haja a possibilidade de troca por falta de peças e de quem faça o serviço, é preciso colocar mais de uma folha para que os tipos, ao baterem no cilindro, não fiquem deformados.
Essa precaução também é importante para diminuir o volume do ruído (para alguns, sinfonia), ainda mais para quem gosta de escrever durante a noite.

Luciano Toriello - 02/10/2015
Escrito com uma Remington Letter-Riter

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Como cuidar bem de uma máquina de escrever - 3


3. Dê um branco no branquinho - pior que o erro é o desastre do branquinho.

Olhe a sua volta. Se tiver um frasco de branquinho por perto, jogue direto no lixo. Nem pense em presentear um colega com isso, afinal, todos nós sabemos que só podemos dar o nosso melhor para os outros, ou seja, tudo que gostaríamos de receber, então, porque empurrar um problema para alguém?

Distraída, a pessoa entra num turbilhão de erros. Primeiro, com o texto, depois, ao tirar o pincel do frasco, deixa derramar um pouco sobre a mesa e pinga todo o caminho até o papel, ou seja, na máquina de escrever, pintando todas as peças para sempre.

Como a lambuzeira no papel não seca bem, ao reescrever, aquilo gruda no tipo que, sem limpeza, acaba borrando todo o resto do trabalho.

Pior, na pressa de tirar a folha, passa pelo rolo, marcando também os roletes internos.

Para limpar a máquina, só mesmo com a ajuda de um profissional, o mecanógrafo, que está cada vez mais raro e caro.

Luciano Toriello - 01/10/2015
Escrito com uma Olivetti Lexikon 80