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quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Como cuidar bem de uma máquina de escrever - 2


2. Apague a borracha da sua vida - a melhor receita para um bom texto datilografado é bem fácil de aprender: - Não erre!
Se errar, não apague.
Retire a folha e comece de novo. Em pouco tempo, vai acertar na primeira tentativa.
Mesmo que se sinta um idiota ou chore de raiva, não deixe de ser cruel consigo mesmo. Se ajudar, imagine que está passando por uma avaliação que só aprova a perfeição.
Em pouco tempo, vai perceber que ficou mais eficiente nos seus textos, até mesmo nas demais atividades, porque aprendeu a pensar antes de agir. Uma habilidade que todos nós temos, mas que foi sendo esquecida com o tempo, principalmente depois que os computadores chegaram e nos apresentaram as teclas "Delete" e "Backspace".
Mas se a disciplina não é o seu forte, tudo bem, livre-se da culpa. Cubra o erro com um "x" e reescreva.
Até mesmo uma letra rebatida é melhor que o borrão produzido com a tentativa de apagar.
Sua máquina vai ficar eternamente agradecida pelo fim da borracha, porque os resíduos não desaparecem, como as pessoas costumam pensar.
Eles se misturam com a oleosidade das partes mecânicas e ajudam a formar uma massa gosmenta que limita os movimentos.

Luciano Toriello - 30/09/2015
Escrito com uma Olivetti Lexikon 80

terça-feira, 29 de setembro de 2015

Como cuidar bem de uma máquina de escrever


  Tirando a garotada de hoje, que chegou ao mundo com a Internet pronta, quem nasceu antes já teve algum contato com uma máquina de escrever, mas foram poucos os que a usaram diariamente e aprenderam os cuidados necessários para mantê-la em ordem.

  Hoje, com a onda retrô, muita gente tem descoberto a delícia que é batucar em uma máquina para produzir um texto, mas tem dificuldade em encontrar informação.

  Por isso, resolvi organizar as ideias e preparar uma espécie de manual que deve ajudar você a manter sua máquina funcionando bem por muito tempo.

  Como textos grandes assustam, vou postar uma dica a cada dia, assim é possível saborear um pouco por vez, sem engasgar.

  1. Evite a poeira - as máquinas são lindas, mas não foram construídas para ficarem expostas como objetos de decoração. A poeira fica grudada nos mecanismos e se mistura com os resíduos de óleo, formando uma pasta que impede os movimentos. As portáteis devem ser guardadas e mantidas no estojo, de preferência com um pequeno saco de silica gel para evitar a umidade. As grandes, sempre cobertas com um pano macio e capa plástica.

Luciano Toriello - 29/09/2015
Escrito com uma Olivetti Lexikon 80


segunda-feira, 21 de setembro de 2015

As histórias das coisas




Os sites de classificados online, como o Olx, são boas fontes para quem gosta de coisas antigas. Confesso que já desenvolvi uma espécie de dependência que me obriga a acessá-los diariamente para monitorar as novidades.

Se me interesso por algo, entro em contato e peço mais informações. Conforme a resposta, combino um encontro para ver pessoalmente o objeto e, se me agrada, compro. Senão, muito obrigado. Nada de dor de cabeça com frete e avaliações.

O mais legal disso é que posso ouvir as histórias relacionadas. Muitas vezes, optei pela compra por causa da história e não pelo valor físico, o que é um erro, mas como não tenho o interesse de comercializar, me dou a esse luxo.

Prefiro as máquinas de escrever, mas infelizmente as que me chegam pertenceram a pessoas que já se foram. Isso não me assusta, porque as máquinas foram feitas para durar muito, enquanto as pessoas, mesmo vivendo com a ilusão da eternidade, são muito frágeis.

Fico triste, apenas, com o desapego que os herdeiros tratam a memória dos seus antepassados, principalmente os mais distantes. Quando a máquina pertenceu ao pai, mãe ou irmão, geralmente é acompanhada de uma série de recomendações como "cuide bem e faça bom uso", agora, quando a herança chegou ao neto ou, ainda mais longe, ao marido da neta, o tom já é mais seco, do tipo "preciso de espaço na casa e nem sei o que fazer com isso". Pior, quando o antigo dono nem chega a ser nomeado, como "pertenceu a uma pessoa que já morreu e isso não nos serve pra nada".

Nessas andanças, gosto mesmo é de encontrar os donos originais, o que é bem raro. Um casal simpático, por exemplo, precisava vender suas coisas para mudar de país e viver perto dos filhos. Ficou evidente o carinho que ainda tinham pela máquina e as histórias não contadas que estavam relacionadas a ela.

Outra senhora precisava desocupar sua antiga casa e não teria espaço para suas coisas no novo apartamento. Havia recebido a máquina de uma pessoa querida que já havia partido, mas não podia manter a lembrança por perto. Ao se despedir, me deu recomendações do tipo "diga para o seu filho o quanto essa máquina é importante".

De alguma forma, minha relação com essas máquinas recebe interferência dessas histórias. Ao escolher uma para escrever, lembro de cada uma delas e penso até que, por isso, produzo textos diferentes, como se cada uma fosse uma parceira com personalidade própria.

Um amigo colecionador, com mais juízo, me diz que isso tudo é uma grande bobagem. Para ele, máquinas são apenas um amontoado de metais com valor dado pela antiguidade, da mesma forma que um quadro é apenas um pano pintado que alguém resolveu que tem valor e pendurou no museu.

Talvez a razão esteja com ele. Ainda assim, prefiro continuar com a imaginação.

Luciano Toriello - 21/09/2015
Escrito em uma Olivetti Studio 45

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

É preciso lembrar e cantar



  Sou de uma geração que viveu a infância sob o domínio da ditadura militar, portanto, recebi todas as influências educacionais direcionadas pelo regime, ainda que tenham sido insuficientes para aplacar o desejo por liberdade e a vontade de sair às ruas gritando por eleições "diretas já" e "abaixo a ditadura", anos depois de muitos jovens serem torturados e mortos em busca desses objetivos.
  Entre as diferenças da educação atual, tínhamos a rotina de cantar, todos os dias, o Hino Nacional, em fila e em plenos pulmões, antes de entrar para a sala de aula.
  Se alguém errasse a letra e o diretor ouvisse, eram mais 10 minutos em pé, ouvindo a ladainha de correções, todos em profundo silêncio. Cantávamos mais de uma vez ou quantas vezes fosse preciso para que o homem ficasse satisfeito e liberasse a entrada.
  Esporadicamente, também cantávamos outros hinos, até mesmo a Canção do Expedicionário.


  Hoje, meu filho de 15 anos diz que nunca foi preciso cantar qualquer hino na escola, nem mesmo em datas comemorativas.
  Entendo que as pedagogas modernas não desejam seguir o protocolo de Educação Moral e Cívica a que éramos submetidos, mas também acho estranho esse completo distanciamento dos símbolos da pátria, que acabam lembrados apenas nas grandes disputas esportivas.
  Também concordo que no mundo atual, em que um susto na China agrava a crise econômica no Brasil, o patriotismo tenha perdido muito do sentido.
  Mas se nossas crianças não aprenderem os hinos na escola, onde vão aprender? Outra pergunta, a quem interessa esse desconhecimento?
  É preciso ter orgulho de onde viemos e de quem somos, sem jamais perder a vontade de mudar e melhorar, afinal, somos todos "Brava gente, brasileira".

Luciano Toriello - 07/09/15
Escrito com uma Remington Letter-Riter

sábado, 5 de setembro de 2015

Pronta para a batalha






Colecionadores de máquinas de escrever gostam das antigas, aquelas produzidas no final do séc. XIX e início do XX, restauradas com pintura e cromados para que pareçam novas.

Tratam como peças de museu, protegidas e inúteis.

Como digo sempre, não sou um colecionador, simplesmente gosto de escrever com elas, por isso não dou a mínima para aquelas que servem apenas como enfeite.

Claro que valorizo as bem conservadas, que foram mantidas na condição original por tantos anos, sem sofrer com os acidentes de percurso, oxidação e quebras.

Mas a primeira condição que me atrai em uma máquina é a sua funcionalidade. Basta escrever bem para ganhar meu coração. Os desgastes de pintura ou manchas nos cromados são apenas uma pátina imposta pelo tempo. O que importa é a precisão dos movimentos e a maciez do teclado.


Por isso, quando vi essa linda e rara Remington Letter-Riter sendo anunciada, com uma fotografia mal focada de celular, me encantei. Mais ainda pelo preço, apenas R$ 50,00, bem menos do que costumo gastar em um pedido de pizza.

Como toda boa máquina produzida nos anos 1950, para mim, a época de ouro para a indústria, o design dessa Remington abusa das formas arredondadas, dos cromados e dos materiais nobres.

Também segue o padrão de durabilidade dos anos dourados, tendo sido feita para durar até a eternidade.

Nesse quesito, minha nova companheira parece imbatível. Tem cara de valente, sem fru-frus. Trouxe até uma bela tatuagem, um número pintado na lateral que indica ter sido usada em alguma instituição militar, o que não surpreende, já que me foi vendida por um oficial da aeronáutica, que a recebeu como herança.


Nem foi preciso substituir a fita. O máximo que devo fazer com ela é espantar a poeira com um compressor de ar. Mais nada. Qualquer outra interferência além de uma limpeza e lubrificação seria um crime contra a sua história.

Mesmo dispondo cada vez menos de espaço, essa Letter-Riter já conquistou a sua vaga entre as minhas máquinas preferidas. E, se um dia resolver escrever um livro ou roteiro de ação, será com esse tanque de guerra que eu vou para a batalha.

Luciano Toriello - 05.09.2015
Escrito com uma Remington Letter-Riter