Translate

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Vale a pena datilografar essa...

Trecho de entrevista com Adib Jatene
Brasília em Dia - Edição Nº 301
Marcone Formiga - Ser infeliz prejudica muito a saúde, não é?
Adib Jatene - Com certeza! A tristeza é uma doença grave. Para o indivíduo se manter feliz, eu costumo dizer que ele deve controlar alguns sentimentos menores. Destes sentimentos menores, talvez sejam a inveja e a vaidade que prejudicam mais as pessoas. A inveja, porque a pessoa sofre com o sucesso alheio; e a vaidade, porque a pessoa fica preocupada com o que os outros pensam sobre o que ela está fazendo. As pessoas que conseguem dominar esses sentimentos têm a sensação de liberdade, e passam a ser quase inatingíveis.

Escrito em uma Lexikon 80
em 26/08/15

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Não dá para restaurar



As coisas têm história e narram sua trajetória de acordo com as características que acumulam com o tempo.
O código se apresenta em pequenos sinais, como uma mancha, um arranhão ou um vício de funcionamento. É possível entender de forma clara como eram as pessoas que utilizaram o objeto, até decifrar uma personalidade que nem mesmo o autor pode ter se dado conta que tinha.
Quando encontro uma máquina de escrever e dedico minhas horas na sua limpeza e manutenção, estabeleço um diálogo com esse personagem-objeto e até sou capaz de enxergar o exato instante que a marca passou a existir.
Quer um exemplo? Uma das minhas máquinas, uma Royal Quiet Deluxe, tem a lateral esquerda com a pintura estufada, pronta para descascar em uma limpeza mais profunda. Ao mesmo tempo, essa máquina tem o teclado leve, daqueles que não enroscam com velocidade rápida. É certo que pertenceu a um escritor, que repousava o braço esquerdo em sua lateral, enquanto consultava um livro a sua direita ou parava para pensar no melhor registro da sua imaginação. Depois da pausa, metralhava suas ideias num único fôlego.
Outras máquinas tiveram um uso profissional, em salas acarpetadas, escrevendo cartas e memorandos. Arranhões nos botões do teclado apontam para os dedos femininos, com unhas compridas e bem pintadas, roçando sobre a tecla enquanto o olhar busca por uma palavra perdida no rascunho. Difícil dizer o que se passava por essa cabeça naquele instante. Talvez o desejo por um sapato novo, os planos de casamentou ou a conta atrasada esperando por um saldo positivo.
Por isso, ao invés de arriscar uma restauração que finge devolver o estado de novo ao objeto, mas que cria, de fato, um palimpsesto em que as marcas são raspadas para um novo registro, que não apaga o passado, prefiro simplesmente deixar o mesmo visual, limpo apenas de sujeira, para que a coisa continue o seu caminho até o agora em que também eu serei traduzido por minhas pegadas.


Luciano Toriello - 24/08/2015
Escrito em uma Olivetti Lexikon 80